Setembro 2011
Use a cabeça, voa pela Real- Aerovias
Nos tempos de Juscelino na década de sessenta o Coronel
Dimas de Freitas, mineiro e próspero fazendeiro
no Vale do Paraopeba em companhia do sobrinho fez
uma viagem ao Rio de Janeiro,então Capital Federal.
A olhar vitrines de lojas ao longo da Avenida Rio
Branco, por onde passeavam, detiveram-se a examinar
roupas masculinas no famoso magazine Casa José
Silva. Chamou-lhes especial atenção umas calças de
‘nycron’: a roupa da moda, a coqueluche do momento.
O tecido não amarrotava, os vincos eram permanentes.
Por sugestão do sobrinho, decidiu comprar duas ‘ para
experimentar’. Provou-as: caimento perfeito, só as
barras por fazer. Estranhou apenas o fecho ecler. E
mais uma vez o sobrinho acudiu a esclarecer: “ era a
moda: no Rio e em São Paulo não mais se usava fechar
as braguilhas com botões.
- Os ajustes seriam feitos num instante, o tempo de
tomarem um cafezinho nas imediações...
- Informou o vendedor.
O Seu Freitas ficou encantado. Não tinha o hábito
de comprar roupas prontas e achou tudo muito cômodo.
O fecho ecler, então! Com uma puxadinha se fechava a
braguilha. Pensou em comprar mais peças,mais acabou
ficando com as duas. Chegou o dia de retorno a Belo
Horizonte. Como bons mineiros,chegaram ao Aeroporto
Santos Dumont com muita antecedência.Estando com
vontade de urinar seu Freitas segurou a ida ao sanitário para o mais perto possível do embarque. Queria evitar o
uso do toalete a bordo. Á primeira chamada, corre o seu
Freitas ao banheiro. Ao fechar, com um puxão, o zíper,
este pega uma parte do prepúcio e outra da ceroula. Enquanto
tentava se desvencilhar, a barriga estorvando a
visão do local, o sobrinho chama-o em voz alta lá de fora:
- Tio, já fizeram a última chamada! ... Olha que a gente
vai perder o avião! ... Está me ouvindo?
- Houve um imprevisto,venha cá ...
- Olhe só o que aconteceu ... aquele trem me pegou
bem aqui ... veja se você consegue me livrar ...
agachando,após se inteirar do que ocorrera,sem contudo,
atinar o que fazer, exclamou:
- Puxa vida ! O Negócio aqui ‘ ta feio, tio ... assim
mesmo vou tentar livrá-lo dessa geringonça ... agüenta
firme.
- Ai,ai ! ... Cuidado,está doendo! ... Assim não!
- Reclamou o tio.
Devido á delicadeza da situação e ao nervosismo
causado pelo medo de perder o avião, após algumas
vãs tentativas o sobrinho desistiu, fazendo o seguinte
comentário:
- É tio,o trem encrencou mesmo! ... Nem alui do lugar
... não vou dar conta não. Mas, o quê foi que o senhor ...
- O que eu fiz?! ... Ora,ora, que pergunta idiota! Deixe
estar ... vamos embora! ... Oh meu Deus! Que coisa
desagradável, chata e incômoda!
Seu Freitas não teve dúvida: pôs-se curvo como um
corcunda, e escondendo com a mão a parte exposta, apresentou-se para o embarque. A Companhia Real-
Aerovias estampava então, em suas aeronaves, a figura
de um homem corcunda, ‘parecidim, parecidim’ com
seu Dimas Freitas. Tal circunstância levou alguém
a perguntar –lhe se ele era parente do homenageado
ou o próprio. Embarcou daquele jeito. A bordo, constrangido
e envergonhado, expôs em cochichos o caso
a aeromoça,que gentilmente o acomodou próximo á ‘
gale’ traseira,pedindo –lhes que aguardasse até a decolagem
e o apagar das luzes de ‘apertar os cintos e não
fumar’- Nem cigarro de Palha. E foi com a maior perícia
que aquela aeromoça,ajoelhada entremeio ás pernas do
Seu Freitas,tirou-o daquela aflição, a um tempo incômoda
e burlesca. No aeroporto da Pampulha, em Belo
Horizonte, comovido de gratidão e vencida já a timidez,
fez questão de descer por último e assim ter a chance
de agradecer tão meritório serviço. – Quis inclusive
gratificá-la, fazendo menção de puxar a carteira,gesto
contido delicadamente por ela. Entremostrando um riso
misto de educação e sarcasmo, ela se despediu:
- Nada a agradecer, seu Freitas! ... É nosso dever e,
antes de tudo,satisfação atender bem aos passageiros! ...
A nós, sim, cabe agradecê-lo por voar na Real-Aerovias!
... Continue,pois, a nos dar preferência. Feliz regresso
ao lar e passe bem!
Use a cabeça,voe pela Real- Aerovias..
(*) José Colombo de Souza Filho (Fortaleza), jornalista, escritor, servidor públicor.