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Fevereiro 2009

Avenidas dos ricos e dos pobres


A primeira casa nossa em Sobral foi o “palácio” do Bispo, como era chamado o velho sobradao que fora habitado por D.José. Fica à entrada da antiga rua Senador Paula, de frente `a Casa da Cultura antiga residência da família do saudoso secretario de agricultura de Parsifal Barroso, Chico Figueiredo.

À noite, desafiando as muriçocas, que eram vorazes, sentávamos- nos em cadeiras na calçada para receber visitas e trocar idéias. De frente, estavam as duas alamedas da Praça do S.Joao (onde fica o Teatro do mesmo nome). Eram a avenida dos ricos e a dos pobres. A dos ricos, era a da Ema, onde estava a ave que Agripino de Sousa,padeiro e poeta comprara para o jardim de sua bela casa à praça do S.Francisco e que ali não coube. Daí sua doação à prefeitura que a localizou na avenida, percorrida pelas moças e rapazes ricos e brancos. Pertinho da coluna onde se ouvia a amplificadora Radio Imperator. Ao lado, ficava a avenida dos pobres. Rapaz de sociedade que ali fosse, geralmente atrás de “cunhas”, assim se denominavam moças pobres, era malvisto e ficava logo manjado por suas notórias intenções.

O tempo passou na janela e fiquei adolescente. Que como todos os rapazes e moças freqüentávamos à noite aquela pracinha, detrás da Igreja do Rosário, acho que Mons. Linhares e depois a da coluna da hora, bem mais ampla. Não havia televisão. Os aparelhos de radio produziam mais ruídos que musica e noticias. A juventude ia passear na praça da coluna da Hora. As moças passeavam geralmente de duas ou em grupo, exibindo-se perante os rapazes que as observavam, de pé, fumando na calçada da avenida, à espera de um olhar da preferia.

Tenho a impressão de que foi ali na praça que levei fora de moça morena com sardas no rosto, pela qual estive perdidamente apaixonado. Como era tímido, passava, durante o dia, dez vezes pela rua onde ela morava, na esperança de que assomasse à janela.

Nunca trocamos uma palavra, tão inibido era eu. Uma vez, porem, criei coragem. “Fiz das tripas coração e a abordei no footing” da avenida. Não me lembra o que lhe disse exatamente. Ela,porém,o entendeu e me de um “chega pra lá”.dizendo-se “comprometida”. Não era noiva mas comprometida com um rapaz que estudava para o concurso do Banco do Brasil.

Foi triste a decepção. Nos meus 17 anos sonhava ser Papa, presidente da Republica ou governador do Estado. Pois bem. Era trocado por uma larva, uma expectativa de bancário que nunca se viabilizou. O cara encerrou o romance., da pior maneira,morrendo.Não noivou nem chegou a bancário.

Neste tempo, havia alto falantes que transmitiam, na praça, do alto do sobrado da farmácia das Irmãs Napoleão, a programação da Radio Iracema. Não saem de minha cabeça duas musicas que tocou, naquela noite, que eram Suburna e Valsa velha, tão boemia quanto seu cantor.

Os amos se passaram. Chegou 1978 quando fui candidato a suplente de senador na chapa de Chagas Vasconcelos, oportunidade fantástica de soltar, na praça publica. o grito contra a ditadura preso na garganta. Estava ali na praça da coluna da hora, no dia 15 de agosto quando me chega a noticia do nascimento de minha filha Sara. Ao saber do acontecido, Paulino de Rocha, homem de radio que apresentava os oradores, comunicou à multidão, ali reunida o nascimento da nova brasileira, pedindo, para ela, uma salva de palmas. E assim Sarinha, nasceu ante os aplausos da população sobralense.

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(*) Lustosa da Costa (Sobral), jornalista e escritor.

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Lustosa da Costa
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